sábado, 21 de novembro de 2009

Segundo levantamento, 40% dos moradores da Estrutural frequentam as igrejas protestantes

Há uma igreja evangélica para cada 93 protestantes na Cidade Estrutural. Um levantamento realizado pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) (leia Para saber mais) mostrou que, entre as 15 regiões mais pobres do DF, a Estrutural é a que apresenta o maior percentual de evangélicos. Lá, eles somam 40,2% da população, um percentual bem maior do que os 32,3% do Riacho Fundo II, que aparece em segundo lugar na proporção comparativa (veja Quadro). Atualmente, o Conselho de Pastores da Estrutural conta 150 igrejas na região, que comporta uma população estimada em 35 mil.

A grande quantidade de evangélicos da Estrutural se justifica em parte pelo crescimento das igrejas protestantes no país, mas a história de formação da cidade mostra por que os católicos não predominam tanto por lá. A Estrutural começou a ganhar contornos quando os moradores do Lixão que dá nome à cidade se reuniram para formar uma comunidade, em meados de 1997. Data dessa época a ação de pastores evangélicos na região, que só enfrentariam a competição da Igreja Católica a partir de 2004, quando surgiu a primeira capela. Só três anos depois seria criada a paróquia São José Operário, principal referência para os católicos da região.

Proselitismo

Enquanto não tinham missas para frequentar, os católicos passaram a visitar os cultos evangélicos. E muitos, como o hoje presbítero da Assembleia de Deus Avelar Rodrigues Pimentel, 40 anos, mudaram de lado. “Fui católico até os 17 anos, quando recebi a visita de pastores evangélicos”, conta o gesseiro, que mora na região da Estrutural desde 1993. Foi com visitas como essa, baseadas na missão de reunir a maior quantidade possível de fiéis, que os evangélicos avançaram pela Estrutural. A ausência de uma tradição católica como as de cidades como Planaltina e Paranoá — onde o percentual de evangélicos não passa de 18% — contribuiu para o crescimento da representatividade.

Outro fator utilizado pelos evangélicos para explicar sua abrangência é o foco no trabalho social, que aproxima os pastores e presbíteros da comunidade. “Se não fossem as igrejas evangélicas, a Estrutural estaria como uma favela do Rio de Janeiro. A criminalidade caiu muito por causa delas”, garante Melk Zedek, presidente do Conselho de Pastores da Estrutural e pastor-chefe da Assembleia de Deus Ministério Missão da Estrutural (Ademme). Segundo Zedek, a forma vibrante com que são realizados os louvores nas igrejas evangélicas também atrai os devotos. “Já tem até uma corrente da Igreja Católica que canta músicas como nós”, compara.

Diferenças
As maiores igrejas, como a Sara Nossa Terra, a Igreja Universal do Reino de Deus e a Assembleia de Deus, têm uma estrutura melhor e reúnem mais fiéis — a Assembleia de Deus Madureira conta com 600 congregados. Mas é difícil encontrar uma rua pela cidade que não tenha pelo menos um templo evangélico, inclusive dentro de residências, com seus 30 seguidores. É o caso da Assembleia de Deus Nova Vida, do pastor e pedreiro Nilson José Santos da Silva, 32 anos, que explica a diferença entre as igrejas: “Muda o nome e a rigidez de cada uma”.

“Tem algumas igrejas que não aceitam que a mulher corte o cabelo ou faça as unhas, que pregam sobre usos e costumes. Mas, na minha, só estou interessado em pregar a libertação”, completa o pastor, que trabalha na construção da Catedral das Assembleias de Deus do Brasil Central, à qual sua instituição é convencionada. Localizado na própria Estrutural, o templo — que, apesar de estar em construção, foi o primeira da região — serve de referência.

É por volta das 20h que os cultos das igrejas espalhadas pela Estrutural começam. Como os fiéis estão diluídos, os templos só ficam lotados em festas mensais, que concentram congregados de diferentes igrejas. “Os cultos semanais servem mais para a oração”, explica Melk Zedek. Como nem toda a Estrutural recebe iluminação pública, a luz dos espaços religiosos — que se destacam entre as melhores construções da cidade — e os gritos de louvor dos pastores, como os próprios diriam, servem de referência para quem estiver perdido.

Variação

De acordo com o presidente do Conselho de Pastores, o número varia anualmente, porque são criadas novas igrejas e outras deixam de existir, principalmente por não conseguir pagar o aluguel da construção onde funcionam. Tão fácil quanto encontrar igrejas funcionando é topar com fachadas desgastadas de templos abandonados.

Hierarquia
As hierarquias das igrejas evangélicas podem variar, mas respeitam basicamente a seguinte ordem: o membro, que é aquele que passou pelo batismo, é promovido a auxiliar e diácono de acordo com seu trabalho na instituição. Para virar presbítero, ele precisa passar por um curso de dois anos, que também o permitirá ser alçado a evangelista e pastor,
nessa ordem.

Organização
Os pastores de cada igreja têm a liberdade de criar estruturas menores que vão se submeter àquelas de que eles faziam parte. Dependendo da forma como cada instituição se desenvolve, ela pode dar origem a vários braços, aumentando sua influência.






Palavra de especialista

Evangélicos são mais ágeis

"Os motivos pelos quais os evangélicos superam os católicos são muitos, mas podem ser sintetizados em duas ideias: a estrutura de seitas independentes é infinitamente mais ágil e responsiva às necessidades subjetivas do que a estrutura planetária da Igreja Católica; e o significado de cristianismo portado pela igreja Católica está irremediavelmente associado aos processos de formação da sociedade, ao longo dos quais a Igreja foi sócia do projeto de dominação europeu que gerou o Brasil.

Por seu turno, o cristianismo evangélico é mais puramente religioso, e a mensagem cristã realmente logra reformar as almas, por não trazer em si uma linguagem política subalternizante escondida. O catolicismo é por demais "espelho" da sociedade, e quem quer mudar de vida não precisa de espelhos, mas, ao contrário, quer ver o que ainda não viu e não sabe. Por tudo isso, creio que a Igreja (Católica), por mais que faça, continuará perdendo adeptos para os evangélicos ainda por um bom tempo."

Eurico Cursino, professor de sociologia da religião do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB).

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